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Abuso sexual infantil: youtuber JoutJout mostra como é importante falar sobre isso

01/08/2019 às 06:30
Tempo de leitura
7 min

O YouTube tem sido um dos maiores meios de comunicação na atualidade, ultrapassando até a televisão. Lá, as pessoas criam seus canais para falarem de assuntos diversos e trazer uma inúmera variedade de projetos e conteúdo. É um mundo totalmente livre de possibilidades. Há pessoas que usam o espaço para trazer diversão, entretenimento, educação, informação e, algumas delas, usam desse espaço para abordar assuntos que geram discussões e questionamentos sobre o mundo e a nossa sociedade. E, nesse caso, sobre o abuso sexual infantil.

Julia Tolezano é uma dessas pessoas. A youtuber nasceu em Niterói, em 1991, é formada em Jornalismo e tem um canal chamado “JoutJout Prazer”, com 2,2 milhões de inscritos. Nos seus vídeos, ela aborda temáticas que giram em torno do feminismo, amor próprio, vida, relacionamentos, questionamentos internos e afins. Dois desses vídeos ficaram muitos famosos, o “Não tira o batom vermelho” e o “A falta que a falta faz”. O primeiro, de 2015, alerta as mulheres sobre relacionamentos abusivos e alcançou, até então, o total de 3,6 milhões de visualizações. E, em 2018, ela lê em vídeo o livro “A parte que falta”, uma obra infantil ilustrava. O livro trata sobre a busca por algo que achamos nos faltar, por meio da história de uma pedra que busca uma alguma coisa que preencha sua parte quebrada. As visualizações chegam a mais de 6 milhões.

Nesta terça-feira (30), Jout Jout divulgou o vídeo intitulado como “O vídeo mais importante desse canal”, que tem quase 200 mil visualizações em 24h. Em 43 minutos, ela aborda um tema extremamente importante e que poucas pessoas falam abertamente: o abuso sexual infantil. Julia passou um mês em Manaus, no Amazonas, conversando com pessoas que trabalham na rede de proteção de crianças e adolescentes vítimas de violência sexual e, foi com elas, que a youtuber entendeu que a maior parte das crianças vítimas de violência sexual, a sofrem dentro de casa, com pessoas do próprio convívio. 

O vídeo é muito denso e pesado, e é difícil de assisti-lo por muito tempo sem um grande nó na garganta. Mas, mesmo que difícil, ele é necessário. Como ela mesmo diz, mais que necessário, ele é urgente. 

Assista o vídeo na íntegra:

YouTube video

Obs: Na descrição do vídeo ela traz muitos meios de ajudar a combater esse problema. 

Sobre abuso sexual infantil

Eu gostaria de começar esse parágrafo com alguns dados. O porém é que esses dados praticamente não existem. Não se sabe ao certo, por exemplo, quantas crianças e adolescentes sofreram abuso no último ano, ou no ano antes dele. Não existem dados concretos que atestem esse fato. 

Ao pesquisar brevemente “Dados sobre abuso infantil” no Google, o que aparecem são algumas matérias de jornais, que é o que eu trarei aqui. Segundo dados que a Agência Brasil coletou com o disque 100, o canal de denúncias, no ano passado, 17.093 de denúncias de violência sexual foram registradas. Desse número, 13.675 foram casos de abuso sexual e, 3.675 de exploração sexual. Neste ano, somente nos primeiros meses, já tinham sido registrados cerca de 4 mil. 

Parece um número muito grande, mas ele é ainda maior. A questão é que, desses números, 70% acontecem dentro de casa. A dificuldade para se denunciar casos de violência e abuso infantil são enormes, e elas crescem exponencialmente quando praticadas por um membro da família. Como agravante, o fato de não falarmos sobre isso, dificulta ainda mais a identificação do crime, considerado hediondo. 

Mas, porque é tão difícil denunciar? A questão é que, normalmente, a criança começa a ser abusada muito nova, por um tio, primo, amigo da família, padrasto, ou até mesmo o próprio pai. A criança abusada acaba entendendo que aquilo é normal, já que é uma pessoa que ela deveria confiar que está fazendo aquilo, por mais que ela se sinta desconfortável. Além da carga de proximidade entre a vítima e o abusador, ele ainda pode fazer ameaças, sendo elas sutis, ou agressivas. O abusador pode criar um meio de manipulação com a criança por meio de falas como “não conta pra ninguém, isso é nosso segredo”, “se você não contar pra ninguém, eu te dou (alguma coisa)”. Agressivamente, ele pode ameaçar coisas importantes para a vítima, como por exemplo “se você contar isso para alguém, eu mato sua mãe”. Diante de tais situações, como uma criança abusada e confusa conseguirá ter um pensamento crítico para ver a importância de não ter medo e de contar pra alguém? Algumas delas são abusadas por anos, até atingirem uma idade que as faça ter condições de falar sobre.

Outro fator importante é falta de diálogo com as crianças sobre corpo e sexualidade. Essa falta de conhecimento das crianças sobre os limites do próprio corpo e sobre o limite que outras pessoas têm que ter sobre o corpo delas, faz com que elas não saibam que se alguém encostar a mão em determinados lugares e fazer certas coisas, é errado. 

E, o abuso sexual, vai além de apenas o estupro de vulnerável, ou seja, a penetração em si. Mãos e carinhos em partes íntimas a fim de estímulo e prazer sexual, é considerado abuso.

Como identificar uma vítima de abuso sexual

Como citado acima, é muito difícil abordar essa questão com a criança, e provavelmente ela não vai falar abertamente sobre isso. O que pode ser feito, é observar mudanças em alguns aspectos relacionados à ela e que possam ajudar a identificar um possível abuso.

De acordo com Elaine Ribeiro, Psicóloga Clínica pela Universidade de São Paulo (USP), seguem alguns desses aspectos:

Alterações comportamentais: agressividade, fuga de casa, isolamento, mentiras, furtos, uso de drogas, prostituição, comportamento hiper sexualizado, masturbação, diminuição do interesse escolar, lazer ou brinquedos, pesadelos, rejeição a alguma pessoa da família ou daquele que possa ser o abusador.

Alterações fisiológicas: insônia, comportamentos regredidos quanto a enurese e encoprese (urinar ou evacuar na roupa ou dormindo), dores abdominais, batimentos cardíacos acelerados, ganho ou perda de peso, mãos suadas, tremores, febres.

Alterações emocionais: tristeza, choro frequente, tentativas de suicídio, embotamento afetivo, medo, raiva, dentre outros.

Alterações cognitivas: dificuldade de concentração, dificuldade de memória, falta de interesse escolar e muitas vezes a queda no rendimento das atividades escolares, baixas notas, faltas.

É importante ressaltar que não é apenas um ou dois desses sintomas que confirmam a presença do abuso, mas sim um conjunto deles. É importante ter observação, discernimento e boa escuta, para não confundir com outros problemas que são normais em estágios de fase de crescimento ou dificuldades de relacionamento. Também é indicado a procura de um profissional especializado.

Denuncie!

Esse assunto é muito extenso e com diversas questões a serem abordadas. Mas, o que eu quero trazer aqui, é a importância de falar sobre ele. E, principalmente, de denunciá-lo. O que torna mais fácil acabar com algum problema, é falar sobre ele. Enquanto esse tema não for amplamente debatido, mais e mais casos de violência vão continuar acontecendo. O importante é que cada um possa fazer sua parte, mesmo que pequena, para combater esse mal.

Para fazer denúncias, utilize o Dique 100. Os dados são encaminhados para investigação. A ligação é gratuita e a denúncia pode ser feita de forma anônima.

* Matéria sob supervisão de Maic Costa

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