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Quanto vale uma curtida?

06/09/2019 às 20:00
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6 min

No dia 17 de julho deste ano, os usuários do Instagram tiveram uma grande mudança no aplicativo. O número de curtidas, ou também chamado de “likes”, que uma publicação na plataforma recebe, passou a não mais ficar visível para todos os usuários. A ferramenta nas redes sociais é aplicada por agora, apenas no Brasil.

As curtidas, uma das principais ferramentas para diagnosticar o desempenho e a relevância dos conteúdos publicados, não irá interferir mais no que os brasileiros dizem gostar ou realmente gostam. Um estudo feito em 2017, pela Sociedade Real para a Saúde Pública, afirma que a ferramenta de curtidas do Instagram tem grandes impactos na sociedade brasileira. Entre eles a ansiedade, depressão e outros efeitos ligados a autoimagem da população, com sua maioria jovens.

Em nota divulgada pela plataforma, ainda na época dos testes da nova ferramenta, eles afirmaram que a intenção de ocultar os likes nas publicações era para “diminuir o clima de competição entre os seguidores”. Além disso, o The Verge, porta-voz não identificado pelo site, afirma que o aplicativo deve ser um local para as pessoas se expressarem, e não um lugar competitivo com um concurso de popularidade.

Entretanto, apesar da mudança, cada usuário ainda terá acesso ao número de curtidas do seu próprio conteúdo do Instagram, não estando aberto ao público.

Além do Instagram, o Facebook também pretende tirar a contagem de curtidas nos posts. A remoção das curtidas pretende conectar as pessoas através das interações, e não pela busca de curtidas e números.

O diretor executivo da plataforma, Mark Zuckerberg ainda não falou publicamente sobre o assunto. O recurso, ainda em estágio de teste e desenvolvimento ainda não está disponível, demorando um longo tempo para ser executado.

As curtidas em prova social

De acordo com a psicologia, a prova social se refere aos “feedbacks”, ou seja, ações que determinam o que é certo ou errado em uma situação de acordo com a sociedade. Quando desejamos ser notados, ou encaixados em um grupo social, nossa tendencia é seguir um padrão social, apresentando tendências e comportamentos referentes a aprovação dos outros.
As curtidas nos aplicativos não seriam diferentes. Dos conteúdos postados espera-se um feedback do outro. Este feedback pode ser representado pelas curtidas. Ou seja, “um like pelo conteúdo que gostei”, “um like pelo conteúdo que me chama atenção”, “um like pelo conteúdo que se encaixa no meu comportamento, ou no meu cotidiano”.
Nos tornamos seres em constante prova social, se comportando, divulgando e postando temas que se encaixem no grupo social “desejado”, ou que transpareçam algo que eu quero que os outros vejam sobre a minha “realidade” – em aspas por muitas vezes não ser uma realidade verdadeira, e sim montada para as redes sociais.

Imagem realmente é tudo?

A resposta para esta pergunta, algumas vezes, para alguns, pode ser sim. Entretanto, as redes sociais muitas vezes são palcos para uma disputa negativa diária sobre quem tem a vida melhor, ou quem está mais feliz com o que está fazendo. Trazendo constantemente uma falsa construção de imagem social.

A felicidade compartilhada no Instagram, nem sempre corresponde à realidade, e sim, a incessante necessidade de se ter uma platéia. Quando compartilhamos uma publicação nas redes sociais, apresentamos o que a gente deseja que nos defina para a sociedade. Trazendo assim para as relações interpessoais, uma auto-imagem, ou seja, a descrição que a pessoa faz de si mesmo para o outro.

A divulgação de imagem, muitas vezes, busca gerar comentários que estimulam a auto-estima e livra da solidão. As pessoas esperam ler elogios ao postarem uma foto e um número grande de curtidas na publicação. Se as expectativas não são alcançadas, a frustração é imediata, e consequentemente o desencadeamento de diversos sentimentos e pensamentos negativos sobre sua auto-imagem.

E qual o motivo dessa constante criação de uma auto-imagem? Por necessidade de se encaixar socialmente? Por desejo de ser visto? Por afirmação? Alimentação de ego? Necessidade de atenção?

Estes sentimentos e pensamentos são protagonistas da atual sociedade. Muitas vezes, a ideia é de que você só existe se é curtido ou compartilhado por alguém. De acordo com um estudo realizado pela Ford, em uma tendência de consumo, 62% dos adultos aumenta sua auto-estima depois de receber curtidas e compartilhamento nas redes.

A necessidade e a ansiedade pela audiência

O imediatismo e a ansiedade pelo feedback quando se posta um conteúdo nas redes sociais, se reflete não só em um narcisismo, mas também em uma carência e uma necessidade de ser notado de forma positiva. A ansiedade de likes vai crescendo e a quantidade se torna muito mais importante do que a qualidade.

O narcisismo, inegavelmente penetrou na sociedade brasileira. Buscamos a aprovação nas redes sociais constantemente e quando recebemos uma curtida, nosso ego cresce. Mesmo nascisistas, nossas versões e personalidades são muitas vezes idealizadas, apresentando personagens que desejamos ser, e não que realmente somos.

As redes sociais afetaram, de fato, as emoções humanas, sendo responsáveis por um comportamento social dependente da aprovação do outro. Diversas esferas emocionais, dependem hoje da audiência virtual. Espera-se pela exaltação do ego, busca-se uma auto-afirmação e uma sensação de pertencimento. Entretanto, esta mesma ansiedade desencadeia frustrações, inveja, curiosidade, medo, baixa auto estima, etc.

Afinal, quanto vale uma curtida?

A resposta correta: nada vale uma curtida, além de uma alimentação do próprio ego. É necessário estar ciente de que a imagem que produzimos de nós mesmos nas redes muitas vezes não condizem com a realidade, então, qual o propósito de se divulgar algo irreal?

Viver é muito mais do que enaltecer uma imagem, ou criar uma imagem idealizada de quem, ou do que, você é. A auto-estima vai muito além de números em uma rede social, e se prender a isso é deixar que sua essência seja estipulada por plataformas digitais.

Ir além das redes sociais é se permitir desconectar-se do digital, e conectar-se com o mundo real. Assim como afirma Carl Jung, psiquiatra suíço, “o privilégio de sua vida é se tornar quem você realmente é”.

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