Menu

Esquizofrenia: precisamos falar sobre o distúrbio da mente dividida

31/10/2019 às 16:00
Tempo de leitura
8 min

Na manhã de quarta-feira, 30 de outubro de 2019, um homem assassinou uma menina de apenas cinco anos, a facadas, na porta de uma escola em Betim, Região Metropolitana de Belo Horizonte. A suspeita é que Moabe Edon Pinto Nogueira Souto, de 25 anos, teria tido um surto de esquizofrenia, pois disse aos policiais que tem um “pacto com o demônio” e que hoje deveria matar uma criança. Algumas pessoas que passavam pelo local tentaram linchar o homem, que teve de ser levado para uma unidade de saúde. Muitos podem ver essa situação e pensar que realmente ele estava “possuído”, ou que é apenas um ser humano ruim, ou mais um assassino.

Porém, a esquizofrenia é uma doença mental real que ainda sofre muito preconceito e estigmas na sociedade. E isso se deve ao fato de que não se fala sobre isso. Diante do acontecimento, mesmo que ainda não tenha sido confirmada sua esquizofrenia, vemos o quão é importante desmistificar a doença.

A esquizofrenia, ou distúrbio da mente dividida, origina da junção de esquizo, que significa “dividir” (no idioma dos filósofos clássicos), e frenia, que se aproxima a “mente”. É caracterizado por surtos em que o mundo real fica distorcido e a mente é invadida por delírios, alucinações, problemas de raciocínio e concentração e falta de motivação. Cerca de 1% da população mundial possui o transtorno, entre eles, 2 milhões de brasileiros.

De acordo com a Associação Brasileira de Psiquiatria, os homens são os mais atingidos, e muitos não são diagnosticados no início. Alguns sintomas, chamados de “sintomas precoces”, inicialmente podem ser confundidos com depressão, ou outros tipos de transtornos parecidos com a esquizofrenia, já que eles podem demorar meses ou anos para se exteriorizar.

A pessoa esquizofrênica perde o contato com a realidade. Ela aparenta estar fechada em si, com olhar perdido e indiferente a tudo que acontece a sua volta. Além dos sintomas clássicos citados acima, também é comumente relacionado a ouvir vozes que só a pessoa escuta e imaginar situações de perseguição ou que está sendo vigiada, como uma espécie de complô diabólico planejado para poder destruí-la. Por isso, ela vive com a sensação de que precisa se esconder ou fugir. Nada que lhe digam faz com que ela entenda que aquilo não é real.

Com isso, a doença afeta o modo como a pessoa pensa, sente e se comporta. Seu comportamento é alterado, ela tem uma certa indiferença afetiva, pensamentos confusos e dificuldade para se relacionar com outras pessoas. E, por mais que não seja uma doença muito comum ou falada, os sintomas trazem muito transtorno e, muitas vezes, tornam a pessoa incapacitada de viver uma vida normal.

Gustavo*, viu de perto como a esquizofrenia afetou seu pai. “Paranoia, medo irracional, mania de perseguição, tudo isso faz parte do cotidiano de um esquizofrênico. A principal mudança na vida do meu pai foi quando ele não conseguia mais trabalhar e teve que se aposentar, por invalidez. Além disso, ele não saia de casa, nem assistia TV, porquê sempre tinha paranoia”, conta.

Esse é um exemplo de como o esquizofrênico, muitas vezes, precisa abdicar de uma vida normal, pois não consegue mais lidar com o mundo real. A doença é uma causa significativa de invalidez no mundo. Nos Estados Unidos, uma a cada cinco pessoas são afastadas ao solicitarem dias de despensa no seguro social. A esquizofrenia é responsável por 2,5% dos gastos com todo o serviço de saúde, sendo uma doença mais frequente que Alzheimer e esclerose múltipla.

Esquizofrenia: precisamos falar sobre o distúrbio da mente dividida

Crédito da foto: Correio Gráficos

Homens e mulheres são atingidos da mesma forma, porém os sintomas nas mulheres aparecem um pouco mais tarde e são em menor proporção.

Por muitas décadas, essa doença era considerada uma loucura, e esses indivíduos eram colocados em sanatórios, pois quase nada se sabia sobre a doença. Há alguns anos, o estudo sobre ela teve grandes avanços, e o tratamento também. Quanto mais cedo a pessoa for diagnosticada e tratada, menos danos ela terá.

YouTube video

Como os sintomas iniciam

No início, surge uma pequena apatia, que pode surgir no final da adolescência, por volta dos 18 anos, e no começo da vida adulta, aos 30. Com o tempo, a pessoa começa a se isolar e, assim, largar atividades rotineiras. Ela começa a apresentar reações estranhas e desajustadas, como não ter reações normalmente esperadas de fatos felizes ou tristes.

Esquizofrenia: precisamos falar sobre o distúrbio da mente dividida

Crédito da foto: Mente e Saúde

Começa a surgir nela uma sensação de que alguém está tentando prejudicá-la e que algo está errado. A partir disso, essa perturbação se transforma em fantasias reais e em teorias da conspiração.

Alguns sinais precisam ser observados, como:

  • Dificuldade no aprendizado desde a infância
  • Apatia
  • Pouca vontade de trabalhar, estudar e interagir com os outros
  • Não reagir diante de situações felizes ou tristes
  • Vozes que surgem na cabeça e outras alterações nos órgãos dos sentidos
  • Mania de perseguição inexplicável

Sintomas

De uma forma geral, eles pertencem a quatro categorias: Sintomas positivos, sintomas negativos, desorganização e comprometimento cognitivo. A pessoa pode apresentar de apenas uma delas, ou de todas. 

Os sintomas positivos, são os delírios e alucinações. No caso dos delírios, como citado assim, podem apresentar, por exemplo, manias de perseguição. Já nas alucinações, é comum a pessoa ouvir vozes, que fazem comentários sobre seus comportamentos, normalmente de forma crítica e abusiva.

Os sintomas negativos são: redução das demonstrações de emoções, pobreza discursiva, anedonia e insociabilidade. A redução das demonstrações de emoções é quando a pessoa exibe pouca ou nenhuma emoção, às vezes seu rosto chega a ficar imóvel. A pessoa também não faz contato visual e não utiliza as mãos e/ou a cabeça para gesticular ao conversar. A pobreza discursiva é a diminuição da fala. A pessoa responde com falas curtas e diretas. Anedonia é a diminuição da capacidade de sentir prazer. E a insociabilidade é a incapacidade de se relacionar com pessoas.

A desorganização é um transtorno de pensamento e comportamento, em dois tipos: transtorno de pensamento e comportamento bizarro. No primeiro, é possível perceber que a pessoa fala coisas incoerentes ou muda de um tema para outro . No segundo, a pessoa tem comportamentos de caráter infantil, além de agitação, aparência, higiene ou comportamentos inadequados. 

No comprometimento cognitivo, o indivíduo possui dificuldade de se concentrar, recordar, organizar, planejar e resolver problemas. Algumas pessoas não conseguem sequer manter o foco para ler um livro ou assistir televisão. Por isso, muitas pessoas precisam se afastar do trabalho, por não conseguir cumprir funções que necessitam de atenção a detalhes ou processos complicados, com tomadas de decisão.

Esquizofrenia: precisamos falar sobre o distúrbio da mente dividida

Crédito da foto: Mente e Saúde

Suicídio

Por todos esses sintomas citados acima, é possível perceber o quanto essa doença afeta a vida da pessoa, o quanto ela pode e vai mexer com o psicológico, assim como a depressão, a ansiedade, e demais transtornos psicológicos.

Por isso, de 5% a 6% das pessoas com o transtorno cometem suicídio e 20% tentam. Mesmo as que não tentam, em sua grande maioria, possuem pensamentos suicidas recorrentes.

A principal causa de morte prematura em pessoas com esquizofrenia, é o suicídio. E a doença também reduz o tempo de vida médio em dez anos.

Jovens do sexo masculino, principalmente os que abusam de alguma substância, possuem um risco maior de cometer suicídios. Também é maior em pessoas que apresentam quadros depressivos.

O risco também é maior em pessoas que apresentaram os sintomas em uma fase mais avançada da vida, principalmente quando a pessoa vinha tenho uma vida boa e equilibrada e de repente começa a apresentar os sintomas. Por ter um desenvolvimento mais tardio da doença, essas pessoas conseguem continuar sentindo mágoa e angústia, o que faz com ajam em desespero, por perceberem o desenvolvimento do transtorno. Mas, também são as aquelas que possuem melhor prognóstico de recuperação.

Violência

Muitas pessoas imaginam que é normal pessoas com esquizofrenia terem comportamentos violentos, mas possuem apenas um risco discretamente elevado. Atos menos agressivos são mais comuns do que comportamentos realmente violentos, onde a pessoa chega a machucar alguém. Apenas uma minoria chega a esse nível de violência.

Pessoas que praticam abuso de álcool e drogas, que tem delírios que estão sendo perseguidas, cujas alucinações orientam a praticas atos violentos, e quem não toma remédio receitados, são as mais propensas a praticar violências graves.

Os médicos consideram difícil prever se uma determinada pessoa poderá cometer ou não um ato de violência.

Tratamento

O tratamento é feito por meio de psicoterapia e medicamentos.

É de suma importância o apoio familiar, e a busca por ajuda.

Esquizofrenia: precisamos falar sobre o distúrbio da mente dividida

Crédito da foto: Mente e Saúde

*nome fictício