Artistas de Ouro Preto cobram prefeito pelo lançamento do edital do Fundo de Cultura

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Uma das classes mais afetadas pela pandemia é a classe artística. Sem poder realizar eventos e se apresentar durante vários meses, os artistas estão sempre na procura de ajuda, principalmente, do poder público, para poderem se manter. Em Ouro Preto, o Conselho Municipal de Cultura está pressionando a prefeitura para que o Fundo Municipal de Cultura tenha seu edital publicado o mais breve possível a fim de conseguirem um recurso para seus projetos ainda neste ano.

Normalmente, o conselho tem um mandato de dois anos, porém, a gestão atual foi prolongado para poder concluir esse processo de publicação do edital do Fundo Municipal de Cultura, que foi aprovado como lei e é repassado para projetos artísticos de Ouro Preto há três anos.

Artistas de Ouro Preto cobram prefeito pelo lançamento do edital do Fundo de Cultura
Foto: Ane Souz / PMOP

O conselho concluiu que o fundo contemplará 30 projetos, com o valor de R$ 10 mil para cada um. Julliano Mendes, dramaturgo, escritor e músico, formado em direção teatral, fala sobre o motivo da pressão para que esse edital seja publicado o mais breve possível.

“É muito importante que lancem o edital este ano e que os habilitados sejam conhecidos este ano, porque aí o orçamento previsto para este ano pode ser aplicado para o ano que vem. Se não lançar esse edital em cerca de uma semana, não vai ter tempo hábil para soltar o edital”, disse Julliano.

O trâmite burocrático para que haja a seleção dos projetos, assinatura do contrato e repasse da verba do Fundo de Cultura é longo. O edital precisa ficar vigente durante 30 dias para receber as inscrições, depois tem pelo menos uma semana para poder ter os recursos apresentados, depois a prefeitura precisa fazer a habilitação dessas propostas e os contratos precisam ser assinados até o final do ano.

De acordo com Julliano, que inclusive já fez parte do Conselho Municipal de Cultura, esse processo já está na prefeitura para ter resolução há meses e agora falta decisão política de lançar o edital. Uma reunião dos conselheiros com a secretária de Cultura e Patrimônio de Ouro Preto, Margareth Monteiro, ocorrida na última terça-feira, 19 de outubro, tratou do anúncio do valor do fundo e apresentado como se dará todo o processo.

Ainda na terça-feira, começou a circular uma arte nas redes sociais com a foto do prefeito de Ouro Preto, Angelo Oswaldo (PV), com a pergunta: “Cadê o edital do Fundo Municipal de Cultura 2021?”

Foto: Reprodução / Instagram

Julliano explica que o intuito da arte é de pressionar o poder público para que o edital seja publicado logo, entendendo que se trata de um procedimento simples.

“O que a gente fez foi dar uma pressionada para a prefeitura fazer um procedimento simples, falta a vontade política do prefeito. A ideia dessa postagem é que a gente tem uma área cultural muito ativa e naturalmente, com a questão da pandemia, está todo mundo muito sem chão. Vários artistas que recebiam auxílio não recebem mais, então esse edital é urgente mesmo”, conta o dramaturgo.

O receio dos artistas de Ouro Preto é que, caso o edital não seja publicado neste ano, ele ficará com o ano que vem, sendo contado com o orçamento de 2022. A classe artística, no entanto, quer que haja o dinheiro do fundo deste ano e outro no próximo ano.

Principal porta-voz do Conselho Municipal de Cultura e produtor cultural do Estúdio ID (Investiga Dança), com mais de 30 anos de atuação aqui na região, Ricardo Campolim, relata que a classe artística de Ouro Preto sempre conquistou seus projetos junto ao poder público através de uma pressão feita sobre os responsáveis e, por isso, o banner foi feito.

“A gente percebe que na cultura temos que ficar sempre em cima, fazendo pressão. Desde a fundação desse conselho, em 2016, conseguimos nossas coisas assim, se não, não sai. Em função disso que nós fizemos ontem (terça-feira) essa postagem. Não considero que seja algo desrespeitoso, mas sim provocativo. Estamos antenados e precisamos de mais respeito com a cultura”, disse o conselheiro.

Já Margareth Monteiro diz que ficou chateada com a publicação cobrando a publicação do edital. A secretária conta que ela conseguiu a verba de R$ 300 mil para o fundo, valor que foi considerado pouco pelos artistas, segundo ela e, por isso, foi preciso adiar o processo. Porém, a tentativa de aumentar a quantia foi sem sucesso e o trâmite foi retomado.

“Ontem (terça-feira) pela manhã houve uma reunião para anúncio do valor e dizer que a partir de hoje (quarta-feira) a gente entraria com os processos e com a solicitação de publicação do edital. Para a minha sorte, eu já deixei o processo pronto, nós não estamos fazendo o edital. Já foi entregue uma minuta para o procurador. O edital está com o secretário da Fazenda para providenciar, atualizar as datas e publicar. A reunião acabou às 11h30, às 11h40 eles lançaram o banner. Eu mandei uma mensagem para o Ricardo Campolim e falei que acho desnecessário sair de uma reunião e já postar uma coisa negativa, isso não é bom para o governo, para vocês e para ninguém”, disse a secretária.

Margareth ainda relata que está fazendo o possível para que o edital seja publicado nesta sexta-feira, 22 de outubro, ou na próxima segunda-feira, 25 de outubro. “Eu fiquei chateada, porque saíram da reunião já reclamando”, complementa. De acordo com a secretária, foi apresentado ao conselho um cronograma para que até o dia 15 de dezembro os contratos com os artistas já estejam assinados.

Ricardo Campolim reconhece o apoio de Margareth, mas não vê motivos para que haja a demora para publicação do edital que, para ele, se trata de um procedimento simples.

“A gente sabe que esse edital, na verdade, já deveria ter sido lançado. É um edital simples, um “copia e cola” da última ação do edital, ou seja, não mudou nada a não ser os valores e a quantidade de contemplados. Serão 30 projetos de R$ 10 mil e fizemos isso para não complicar no setor jurídico, porque se mudarmos uma vírgula no edital, atrasa mais”, disse o conselheiro.

Falta de política cultural

A classe artística de Ouro Preto, representada pelo conselho, enxerga uma ausência de política pública voltada para a cultura. Um dos motivos da publicação do banner, inclusive, foi a intenção de provocar Angelo Oswaldo, que carrega o setor cultural como uma de suas bandeiras, tendo sido editor do Suplemento Literário de Minas Gerais. O prefeito de Ouro Preto também presidiu o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) e foi chefe de gabinete do Ministério da Cultura de forma interina e foi. Além disso, ele foi secretário de Estado de Cultura de Minas Gerais, entre 1999 e 2002, no governo Itamar Franco.

“A nossa opinião é muito concreta, Ouro Preto não tem uma política pública de cultura. A gente fez no conselho um plano de cultura que é decenal que está na Câmara para ser votado e não é votado, porque falta vontade política de aplicar. Entendemos que existe agora uma necessidade de uma ação política em cima da área cultural ouro-pretana e o Fundo Municipal de Cultura é só a ponta desse iceberg, mas ele é fundamental”, diz Julliano.

Mais inquietações sobre a falta de ações para o setor da cultura durante o mandato de Angelo partem de Ricardo, que reforça a necessidade de uma política cultural na cidade de Ouro Preto.

“A nossa mobilização se deu porque a gente percebeu uma falta de cuidado e atenção especial para a cultura no município. O prefeito Angelo Oswaldo tem uma fama de dar atenção ao setor cultural e turismo, mas estamos vendo pouco movimento na cultura. Precisamos de uma política cultural, temos vários dispositivos para isso, mas ainda não aconteceu nada nesse início de governo. O plano municipal de cultura, que é um projeto de lei que está engavetado na Câmara desde novembro de 2019, não avançou. Outra demanda do conselho é o sistema municipal de cultura que está para ser implementado, mas ninguém se mexeu para isso e os artistas todos aí estão passando dificuldade e uns até fome”, critica Campolim.

Reforma adminsitrativa

Artistas de Ouro Preto cobram prefeito pelo lançamento do edital do Fundo de Cultura
Foto: Ane Souz / PMOP

De acordo com o mapeamento feito pelo conselho, são mais de 150 trabalhadores ou representantes de grupos, dos mais diversos, do setor cultural na cidade. Em Ouro Preto, Cidade Patrimônio Mundial da Humanidade, são 12 distritos e sede, com mais de 400 comemorações religiosas e folclóricas, 12 casas de cultura e museus, que precisam de uma atenção especial por parte do poder público.

Com isso, a necessidade de uma reforma administrativa, separando a Secretaria de Cultura e Patrimônio em duas pastas, uma tratando apenas do setor cultural e outra do patrimonial, é um consenso entre os artistas e Margareth Monteiro.

“O problema é que quando fizeram essa junção de secretarias, talvez pensaram no patrimônio histórico de Ouro Preto, mas na prática não é assim. Patrimônio lida com habitação, a demanda da secretaria de Patrimônio é gigantesca e inviabiliza uma gestão mais focada e dinâmica da cultura, que Ouro Preto merece. É absurdo que as pessoas não percebam o potencial, inclusive como gerador de emprego e renda, da cultura”, opina Julliano Mendes.

Ricardo, inclusive, disse que reconhece o trabalho que Margareth vem fazendo e, por isso, o banner tem a foto de Angelo Oswaldo, colocando a cobrança no prefeito para que haja uma maior atenção na pasta da cultura por parte do prefeito.

“A Margareth Monteiro está nos apoiando e brigando para isso, mas a gente percebe uma falta de força política, porque ela comanda uma secretaria de cultura e patrimônio e, segundo ela mesma, ela fica por conta mais pela cultura do que pelo patrimônio e a cultura fica mais uma vez fica mais uma vez fica em segundo plano. Não temos uma secretaria municipal de cultura, específica, essa é uma das nossas lutas. A cultura pode e deve ser tratada de uma forma diferenciada. Então, a parte da cultura da prefeitura é tratada como licitações. Vários municípios de todo o Brasil tem essa política cultural diferente, com segurança e acessibilidade aos produtores culturais”, diz Ricardo.

De acordo com Margareth, há uma motivação da atual gestão de fazer uma reforma administrativa para separar a cultura do patrimônio. Segundo a secretária, a divisão vai ser feita através de uma proposta que será entregue à Câmara Municipal para votação e é esperado que em 2022 a secretaria de Cultura esteja desmembrada do Patrimônio.

“O patrimônio tem uma demanda muito grande, mas, por outro lado, a nossa equipe não deixou de atender a nada na cultura. Até porque a cultura é muito mais que os artistas locais, são os distritos, patrimônio imaterial, as festas tradicionais, os dossiês e registros de tombamento, o ICMS, então é muito mais. A pasta da cultura é realmente cheia de atribuições e funções, assim como o patrimônio”, relata Margareth Monteiro.

No entanto, ainda segundo a secretária, mesmo depois do desmembramento da secretaria, toda a parte de proteção do patrimônio cultural vai para a pasta da cultura. O que vai ficar no patrimônio são as aprovações de projetos, a urbanização e reurbanização da cidade, plano diretor, loteamentos e etc.

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