A aprovação, em primeiro turno, do projeto de lei (PL) do governador Romeu Zema (NOVO) que autoriza a desestatização da COPASA acendeu um alerta importante em nosso estado. A votação de terça-feira dia 02-12 ocorreu sob forte pressão política e pouca disposição para debate técnico, deixando vários pontos obscuros sobre os reais impactos da medida na vida dos mineiros. A pressa, nesse caso, não parece compatível com a complexidade do tema — tampouco com o tamanho da responsabilidade.
A promessa central do governo é de que a privatização trará maior eficiência para o saneamento básico no estado. No entanto, experiências recentes em outros locais do país sugerem o contrário. A expectativa de ampliação de investimentos costuma ser substituída por reajustes tarifários acima da inflação e serviços pouco sensíveis às necessidades sociais. Nada disso aparece claramente respondido no projeto aprovado.
Especialistas, além de entidades de trabalhadores e pesquisadores da área de políticas públicas, têm alertado que o modelo mineiro pode repetir erros já conhecidos. A COPASA, apesar de suas falhas, é reconhecida como uma empresa sólida, com capacidade comprovada de investimento. Desestatizá-la sem apresentar garantias concretas de melhoria significa entregar um serviço essencial à lógica privada — cuja prioridade, inevitavelmente, é o lucro de poucos em detrimento do interesse público.
Outro ponto a ser lembrado é a desigualdade entre os municípios mineiros. Cidades pequenas e médias, especialmente nas regiões mais distantes, dependem de subsídios cruzados para manter tarifas acessíveis. Uma empresa privatizada dificilmente terá interesse em operar onde o retorno financeiro é baixo. A consequência provável é a exclusão silenciosa: localidades menos rentáveis ficam à mercê de contratos frágeis ou de aumentos tarifários contínuos.
A tarifa, aliás, é a grande preocupação. O histórico das privatizações no setor de energia e saneamento no Brasil mostra que promessas de redução nunca se concretizam. Ao contrário: o consumidor costuma pagar mais, muitas vezes sem perceber melhora perceptível no serviço. O governo mineiro não apresentou cálculos que sustentem a tese de que as contas de água ficarão mais baratas — porque, ao que tudo indica, isso não ocorrerá.
Também chama atenção o momento escolhido para avançar com o projeto. Minas Gerais enfrenta graves dificuldades financeiras, dada à má gestão do governador, e há quem veja na COPASA como a oportunidade de levantar recursos imediatos. Mas vender um ativo estratégico para cobrir rombos momentâneos é uma decisão que compromete décadas futuras. É o tipo de solução fácil que costuma gerar problemas ainda maiores adiante.
Nas regiões onde a autarquia atualmente atua especialmente no interior do estado, prefeitos e vereadores têm demonstrado preocupação com os impactos da privatização sobre os serviços de abastecimento e tratamento de esgoto. Municípios que dependem de parcerias estáveis com a companhia temem que novos contratos, guiados exclusivamente pelo lucro, deixem demandas locais em segundo plano.
Outro aspecto raramente discutido é a fiscalização. Vender um ativo público não significa se livrar do problema: significa exigir um Estado ainda mais presente. Sem uma agência reguladora forte, democrática e com capacidade técnica, qualquer promessa de qualidade se perde. Hoje, entretanto, não há garantias de que esse aparato esteja pronto para controlar uma empresa privada que administraria um serviço vital.
O discurso de modernização, portanto, aparece mais como slogan do que como projeto consistente. Falta transparência, falta debate público e falta responsabilidade em relação ao impacto que essa decisão terá sobre milhões de mineiros. O saneamento é um direito básico, não uma mercadoria para ser negociada ao sabor das conveniências políticas.
A votação em primeiro turno não encerra o tema, mas deixa claro o rumo que o governo estadual pretende seguir. Resta saber se a Assembleia Legislativa, no segundo turno, estará disposta a discutir seriamente os riscos ou se continuará alinhada à pressa e aos interesses escusos que marcaram essa primeira aprovação. Minas Gerais merece mais do que decisões improvisadas sobre um serviço que define a qualidade de vida, a saúde pública e o futuro de muitas de nossas cidades.



