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Ouro Preto, o berço da educação farmacêutica na América Latina

Rodolpho Bohrer
O acervo do Museu da Farmácia preserva quase dois séculos de ciência e formação profissional
O acervo do Museu da Farmácia preserva quase dois séculos de ciência e formação profissional

Imagine Ouro Preto em meados do século XIX. As ruas de pedra ecoam o som de cascos de cavalos, os sinos das igrejas barrocas marcam o tempo e, em meio à calmaria das montanhas mineiras, uma revolução silenciosa começava a tomar forma. Em 4 de abril de 1839, a então capital da Província de Minas Gerais recebia a primeira instituição voltada exclusivamente à formação de farmacêuticos no Brasil e em toda a América Latina: a Escola de Farmácia de Ouro Preto.

O dia em que Foucault “se perdeu” nas ladeiras de Ouro Preto

A criação dessa escola representou uma mudança profunda na forma de compreender e praticar a ciência no país. Até então, o ensino de farmácia era apenas uma extensão dos cursos de medicina, com ênfase reduzida na experimentação e sem laboratórios próprios. Pela primeira vez, a profissão passaria a ter um espaço independente, com currículo próprio, corpo docente especializado e objetivos voltados à pesquisa e à saúde pública.

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O nascimento de uma nova ciência

O impulso veio do contexto histórico. Com a chegada da família real portuguesa em 1808, o Brasil viu crescer a necessidade de organizar o ensino científico. Três décadas depois, a criação das primeiras faculdades de medicina gerou também a demanda por profissionais que dominassem a arte de preparar, analisar e estudar substâncias medicinais.

Foi nesse cenário que a Escola de Farmácia de Ouro Preto surgiu como pioneira. O decreto provincial nº 140, de 1839, determinava que apenas formados pela nova instituição poderiam exercer a profissão em Minas Gerais. Era o primeiro passo para a profissionalização da farmácia no Brasil.

A aula inaugural ocorreu em 7 de setembro de 1840, e, desde o início, a instituição se destacou por reunir alguns dos cientistas mais influentes do século XIX. O prédio original, no Largo de Coimbra, abrigava pequenos laboratórios e uma biblioteca que já refletia o espírito inovador da época.

O espaço e sua memória

Com o passar dos anos, a Escola de Farmácia consolidou-se como centro de excelência no ensino e na pesquisa. Em 1893, a instituição foi transferida para a Rua Costa Sena, número 171, onde permaneceu até o início do século XXI. Esse prédio foi tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) em 1938 e hoje abriga o Museu da Farmácia de Ouro Preto, que preserva frascos, mobiliário, livros raros e instrumentos científicos usados nas antigas aulas práticas.

Crédito: Arquivo Museu da Farmácia

O acervo é uma verdadeira viagem no tempo. As antigas bancadas, os potes de porcelana e as balanças de precisão ainda guardam o cheiro das ervas e substâncias manipuladas por gerações de estudantes. Cada sala conta parte da história de uma profissão que, pouco a pouco, ajudou a consolidar o conhecimento científico no Brasil.

De escola a universidade

A história da instituição se entrelaça com a modernização do país. Após a Proclamação da República, a Escola de Farmácia passou a ser reconhecida nacionalmente como modelo de ensino. Décadas depois, em 1969, sua fusão com a tradicional Escola de Minas deu origem à Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP), ampliando o alcance da pesquisa e da formação acadêmica.

Hoje, o curso de Farmácia da UFOP mantém o mesmo espírito pioneiro que guiou seus fundadores. Suas atividades se concentram no campus Morro do Cruzeiro, com laboratórios modernos, programas de pós-graduação e projetos de extensão voltados à comunidade. A instituição também teve papel importante na criação do Conselho Federal de Farmácia, que regula e valoriza a profissão em todo o país.

O legado que permanece

A Escola de Farmácia de Ouro Preto é mais do que uma instituição centenária. Ela representa o ponto de partida para a autonomia científica e para o reconhecimento do farmacêutico como agente essencial da saúde pública.

Durante a pandemia de Covid-19, a UFOP manteve viva essa tradição ao produzir álcool em gel, orientar a população e apoiar o sistema de saúde local. A dedicação à ciência e à sociedade é um reflexo direto do compromisso iniciado há mais de 180 anos, quando um grupo de visionários decidiu transformar Ouro Preto em referência para toda a América Latina.

Conhecer essa história é compreender que cada remédio, cada pesquisa e cada descoberta farmacêutica no Brasil carrega um pouco da memória das ladeiras de Ouro Preto e dos bancos de madeira onde nasceu a ciência da farmácia brasileira.

Linha do tempo

Linha do tempo da primeira Escola de Farmácia do Brasil

1839 Criação da Escola de Pharmacia

A província de Minas Gerais sanciona o decreto que institui a Escola de Pharmacia em Ouro Preto, primeira dedicada exclusivamente à formação farmacêutica na América Latina.

1840 Aula inaugural

As atividades começam no Colégio Assunção, no Largo de Coimbra, com acervo e laboratórios pioneiros para a época.

1893 Mudança para a Rua Costa Sena

A Escola se transfere para o número 171 da Rua Costa Sena, endereço que se tornaria referência do ensino farmacêutico por mais de um século.

1938 Tombamento pelo Iphan

O edifício histórico é tombado pelo Iphan, reconhecimento do valor científico e cultural do patrimônio.

1969 Nasce a UFOP

A fusão da Escola de Farmácia com a Escola de Minas cria a Universidade Federal de Ouro Preto, ampliando pesquisa e pós-graduação.

2013 Consolidação no Morro do Cruzeiro

As atividades acadêmicas se concentram no campus Morro do Cruzeiro com laboratórios atualizados e infraestrutura de pesquisa.

2025 186 anos de história

A escola segue como referência nacional em ensino, pesquisa e memória da farmácia no Brasil.

Quiz rápido sobre a Escola de Farmácia

Em que ano foi criada a Escola de Pharmacia em Ouro Preto
Qual foi o primeiro local de funcionamento
O que marcou a criação da escola em 1839

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Diretor geral, graduando de jornalismo e redator de cidades e política.