A Prefeitura de Mariana promoveu uma Audiência Pública na noite dessa terça-feira, 26 de outubro, no Centro de Convenções, para se discutir a proposta de alargamento da calçada na rua Dom Viçoso, localizada na Praça Gomes Freire, mais conhecida como Jardim, no centro da cidade.
Depois da apresentação do projeto, considerações dos especialistas e ouvidas as opiniões da população, a proposta foi rejeitada pela maioria dos moradores presentes. Os dois problemas levantados pelos moradores são a possível confusão que tal interferência pode causar no trânsito na rua e a descaracterização do patrimônio da praça.
“Se a preocupação é sobre a acessibilidade, como que se chega um portador de deficiência até o Jardim? Eu tenho conhecidos que moram próximo ao colégio Providência que não chegam até o Jardim, porque em Mariana inteira os postes estão no meio do passeio. Então, por que a preocupação só com o Jardim? Na rua Bom Jesus não se anda no passeio, anda na rua, na Venceslau Brás também. Vamos preocupar com as coisas mais essenciais, porque o deficiente não chega até o Jardim não. Não concordo com o projeto, é muito moderno, não é a nossa cidade”, disse Tânia, que mora em frente ao Jardim.
Eduardo Campos, diretor do Museu Minas, trabalha na área da Cultura há 35 anos. Ele é nascido e criado em Mariana, formado em Belas Artes pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e também se posicionou contrário ao alargamento da calçada. “Esse projeto me faz lembrar o primeiro que foi apresentado lá no SESI, numa Audiência Pública, que foi rejeitado pela maioria. Uma coisa que não ficou clara na época foi a questão dos materiais que foram utilizados na Praça Gomes Freire, que eram modernos e não tradicionais. Pedra cerrada industrializada, granito escovado, substituir muro de cal. Sabemos que em Mariana temos outros pontos que as pessoas não têm acessibilidade e mobilidade, que são muito mais perigosos que a rua Dom Viçoso, como a Venceslau Brás e o Catete. Então, dá a impressão que mexer no centro histórico se tornou sinal de modernização e desenvolvimento e não é isso. Luto pela preservação de patrimônio. Sou totalmente contra o projeto.”
O projeto
O principal objetivo do projeto, segundo o arquiteto da Prefeitura de Mariana, Thales Capucci, é melhorar as questões de mobilidade urbana e acessibilidade universal do espaço, além de melhorar o fluxo de trânsito de veículos.
Conforme foi apresentado, o alargamento da calçada da rua Dom Viçoso contaria com a construção de quatro rampas de acessibilidade, um largo em frente ao SESI seria construído e haveria uma mudança para uma via de mão única no sentido Centro a Chácara, e quem fizesse o caminho inverso teria que passar pela rua do Seminário, depois na rua Barão de Camargos, desceria pela travessa João Pinheiro ou subiria para a Praça Minas Gerais.
Quanto à conservação do patrimônio, Thales explicou que o projeto contempla tal quesito e também salientou a necessidade da contemporaneidade na cidade.
“O projeto acompanha toda a teoria de restauração do patrimônio. Sou estudioso da área e acho que hoje estamos em um momento contemporâneo, tudo que fizermos estaremos fazendo história e fazemos parte dessa história”, disse.
Juliano Duarte (Cidadania), prefeito interino de Mariana, explicou que o recurso que seria utilizado no projeto é exclusivamente para o alargamento da calçada da rua no Jardim, não podendo destiná-lo para outras prioridades do Município.
“O recurso é para o Jardim, não é para a Venceslau Brás, Bom Jesus ou Manoel Leandro Corrêa. Se o recurso for utilizado no Jardim, ele será usado, se não for, ele será devolvido para a Fundação Renova. Falar que não tem acessibilidade, eu desafio alguém me falar uma cidade de Minas Gerais que é 100% acessível. Nós estamos caminhando. Estamos retirando os postes do centro histórico, estamos fazendo o projeto da Venceslau Brás e as coisas estão acontecendo”, explicou o prefeito.
Veja fotos do projeto:
Maioria contra a Minoria
Altair Marquete, que mora há 37 anos no entorno do Jardim, também se pronunciou contrário ao projeto durante a Audiência Pública. Para ele, a maioria não pode pagar pela minoria (portadores de acessibilidade remota) e disse que se sentiria lesado com o alargamento da calçada da rua Dom Viçoso.
“Deveria fazer um estudo melhor sobre as pessoas que moram no entorno. Quando se fala em acessibilidade, eu concordo, ela não atrapalha em nada a situação. Agora, quando se fala em restringir aquela rua e me falam que isso vai facilitar o acesso de veículos, eu não concordo. Não sou contra nada ou ninguém, mas eu acho que as pessoas que moram ao redor têm que ser analisadas também, não é só falar que vai melhorar para o povo. As ruas não devem ser fechadas ou interditadas em privilégio de uma minoria. Isso está na Constituição e no código civil. Então é o seguinte, acessibilidade sim, alargamento de passeio não”, manifestou Altair.
O vereador Ricardo Miranda (Republicanos) concordou com Altair. Além disso, o membro do poder Legislativo municipal disse que Mariana tem outras prioridades.
“O projeto é muito bacana, mas eu vejo a insatisfação do povo, já teve anteriormente com relação ao Jardim, eu fiquei frustrado como um cidadão, com a mudança do Jardim. Em uma casa que tem 10 pessoas, com duas diabéticas. A alimentação das oito não vão mudar por causa das duas. Acho que tem que haver um consenso, mas a minoria não pode se sobrepor a maioria. Está certo que o recurso é para fazer na praça, tudo bem, mas temos recursos presos de R$ 70 milhões para fazer a manutenção da rede de esgotos. Eu não sou contra a acessibilidade obviamente, mas temos outras prioridades”, disse o vereador.
Por outro lado, uma cadeirante, moradora de Mariana, que não se identificou, ressaltou a importância do alargamento da calçada da rua Dom Viçoso para a sua acessibilidade e pediu para que os demais não pensassem apenas em si, mas em todos os deficientes da cidade ou visitantes.
“É muito importante fazer o alargamento, porque é um pouco do desenho universal. Onde passa uma pessoa, passa todas. Eu não estou falando só por mim, mas para um deficiente visual, um cadeirante, um idoso, uma criança, uma mulher grávida. É muito difícil ter acesso ao Jardim, onde acontece todos os eventos importantes. Às vezes as pessoas querem chegar até lá e não conseguem. Então, esse é um pequeno avanço das acessibilidades que virão. Eu sei da dificuldade de sair da Vila Maquiné e ir até o Jardim com essa cadeira, às vezes para fazer esse trajeto, eu precisei de seis pessoas, cada hora uma oferecendo uma ajuda. É um projeto muito bacana, espero que as pessoas vejam isso como um ponto positivo e não vejam só por elas, mas por todos os deficientes também”, disse a moradora.