Busto esculpido por Aleijadinho voltará definitivamente a Ouro Preto

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O busto de São Boaventura, esculpido pelo mestre Aleijadinho no século XVIII, que estava sob posse de um colecionador em São Paulo, vai retornar definitivamente para o acervo da Igreja de São Francisco de Assis, em Ouro Preto, na Região Central de Minas Gerais. A decisão da Justiça atende pedido formulado pelo Ministério Público de Minas Gerais (MPMG).

A 2ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça, por 4 votos a 1, concluiu, na  terça-feira, 10 de dezembro, o julgamento das apelações iniciado em setembro deste ano, e confirmou a sentença da 1ª Vara Cível da Comarca de Ouro Preto, em Ação Civil Pública proposta pelo MPMG.

Durante as apurações, perícia confirmou que a peça pertencia ao conjunto de bustos esculpidos por Aleijadinho. De acordo com o relator, desembargador Caetano Levi, a obra integra o patrimônio histórico de Ouro Preto e “está protegida pelo tombamento da igreja e pelo Decreto nº 22.928, de 1933, que erigiu a cidade à categoria de Monumento Nacional.

Ele ressaltou, ainda, que, “se a peça encontra-se irregularmente em poder de particulares, revela-se correta a determinação para a sua reintegração ao acervo de origem”. Isso porque, conforme o magistrado, “a obra de arte, que constitui patrimônio público histórico, artístico e cultural do país, integra a categoria de bens fora do comércio e, portanto, não pode ser adquirida por usucapião”.

Já o juiz de Direito convocado Rinaldo Kennedy Silva, em seu voto, enfatizou os efeitos danosos do “mercado negro” de peças sacras, estimulado pela falta de segurança das igrejas e dos templos religiosos. Ele lembrou que “o extravio em massa ocorrido no país viola frontalmente princípios próprios do patrimônio cultural, em especial o da fruição coletiva e o da conservação in situ, o qual também é denominado da vinculação dos bens culturais a seus locais de origem”.

O desembargador Marcelo Rodrigues, por sua vez, citou, ao votar análise técnica do especialista Guilherme Ataídes, segundo o qual, o busto integra um conjunto, em que “cada Santo Doutor tem local específico na banqueta como demonstração da controvérsia ideológica fundamental entre as duas Ordens Franciscanas, uma, conformando a doutrina evangélica às teses dos filósofos gregos, sob o prisma da vontade sobre a razão (São Boaventura e Venerável John Duns Scott); outra, pautada na primazia da razão sobre a vontade (Santo Tomás de Aquino e Santo Antônio de Pádua)”.

A obra já estava em Ouro Preto desde 2014, quando o TJMG concedeu tutela antecipada em um agravo de instrumento para que a escultura fosse mantida na cidade até o julgamento final da ação.

Os recursos foram acompanhados, na 2ª instância, pelos procuradores de Justiça Gisela Potério Santos Saldanha e Antônio Sérgio Rocha de Paula, da Procuradoria de Direitos Difusos e Coletivos, os quais contaram com a atuação conjunta do promotor de Justiça Domingos Ventura de Miranda Júnior na elaboração e entrega dos memoriais.

Conjunto de bustos relicários

Segundo o arquiteto e urbanista Ismar Ataídes, em manifestação no dossiê de tombamento, para se entender a precisão dos detalhes nas quatro figuras em série, é necessário imaginar os bustos colocados lado a lado, sendo, da esquerda para a direita, São Boaventura, Venerável Duns Scot, Santo Antônio e Santo Tomás de Aquino.

Verifica-se então:

1°) São Boaventura olha para a direita, enquanto Santo Tomás de Aquino olha para a esquerda; com isso, “divergem”;

2°) os dois santos centrais olham para a frente;

3°) o Venerável Duns Scot é sério e triste; Santo Antônio tem o rosto alegre e quase sorridente; a tradição católica atribui-lhe grande bondade;

4°) Dois dos Franciscanos (São Boaventura e Venerável Duns Scot) têm barbas, os outros dois (Santo Tomas de Aquino e Santo Antônio de Pádua) são glabros;

5°) Santo Tomás de Aquino, espelhando a realidade, é figurado como obeso, rosto cheio e duas papadas (barbela). Também os topetes são diferentes em cada um dos santos.

“Esses Santos Doutores foram o centro da controvérsia ideológica fundamental das duas Ordens: a conformação da doutrina evangélica às teses dos filósofos gregos, sob o prisma da vontade sobre a razão (São Boaventura e Venerável John Duns Scot) ou da razão sobre a vontade (Santo Tomás de Aquino e Santo Antônio de Pádua).

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