Revitalização do Jardim de Mariana: entrevista com secretário de Cultura tira dúvidas da população; veja projeto e opiniões

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Prefeitura de Mariana anunciou, no dia 11 de setembro, o projeto de revitalização de um dos principais pontos turísticos e de convívio social da cidade: a Praça Gomes Freire, também conhecida como Jardim de Mariana. Muito belo e um ponto verde em meio as pedras históricas do município, o local costuma reunir visitantes e moradores da cidade, que aproveitam os diversos estabelecimentos que rodeiam a praça para momentos de lazer e descontração. É incomum ver o jardim vazio, mesmo em dias de semana ou de manhã cedinho.

O anúncio da revitalização do Jardim, apesar de tratado como um grande avanço pelos órgãos públicos marianenses, acabou trazendo muita discussão e dúvidas entre os moradores da cidade. Alguns aprovavam, outros discordavam das obras e era muito comum ver comentários questionando a aplicação de recursos em um local já “pronto”, como diziam os próprios marianenses. Por isso, o portal Mais Minas decidiu buscar os órgãos competentes e a população para levantar e esclarecer os principais questionamentos quanto a obra, entrevistando assim o secretário de Cultura, Patrimônio Histórico, Turismo, Esporte e Lazer da cidade, Efraim Rocha, comerciantes e a população em geral.

Revitalização do Jardim de Mariana: entrevista com secretário de Cultura tira dúvidas da população; veja projeto e opiniões
Foto: Arquivo/Mais Minas

A revitalização

Primeiramente, precisamos entender o que será feito na Praça Gomes Freire e qual a ideia da revitalização. Para isso, solicitamos junto a Fundação Renova, responsável pelo repasse das verbas que viabilizarão as obras, o projeto de revitalização do Jardim de Mariana (o PDF contendo o projeto poderá ser baixado no final deste tópico).

Um ponto importante é a terminologia a ser usada. O Jardim não será reformado e sim revitalizado, que são conceitos diferentes. Em uma reforma é desnecessário ter cuidado com a aparência original daquilo com que se trabalha. Numa revitalização, as características originais do que se quer restaurar tem de ser mantidas. Por isso até evitaremos chamar a obra de “novo Jardim”.

Bom, indo ao teor das obras, segundo o projeto, a proposta de revitalização consiste em:

A proposta de revitalização tem como objetivo devolver à Praça Gomes Freire seu esplendor, revalorizando-a como patrimônio histórico e paisagístico de Minas Gerais e como cenário da vida dos marianenses.

Esta proposta pretende reafirmar seu valor histórico, simbólico e afetivo, adaptando-se às novas realidades e respeitando sua essência.

O que será mudado?

Entre as melhorias anunciadas pelo projeto, estão acessibilidade, com inclusão de melhores acessos às pessoas com necessidades especiais; paisagismo, com mudanças na vegetação; lagos e pontes, revitalizando algumas das partes que compõe o belo projeto arquitetônico do jardim; iluminação, que sempre mostrou deficiências no local; Mobiliário, como os bancos; e materiais, o que se usa para construir o jardim. Na questão do restauro, são objetivos o Bebedouro, o Coreto e o Busto Gomes Freire, que se desgastaram com o tempo.

Um dos principais pontos da obra e que mais mudará a dinâmica atual do Jardim de Mariana é o rebaixamento da praça ao nível da rua. Isso se dá, segundo os órgãos responsáveis, pela questão da acessibilidade. Outra mudança que vem sido falada é a da vegetação, que será trocada para valorizar a beleza do lugar e para tornar mais visível o conjunto arquitetônico que cerca o local.

Clique aqui e baixe o arquivo do projeto de revitalização do Jardim de Mariana

O que diz o município?

Pelo grande número de dúvidas que pairavam sobre a revitalização do Jardim, em meio a população marianense, como a fonte e a alocação das verbas, situação de eventos e dos comerciantes e outros problemas da cidade, procuramos a Prefeitura Municipal para dar um posicionamento e informações sobre as obras e assim marcamos entrevista com o secretário de cultura, patrimônio histórico, turismo, esporte e lazer da cidade, Efraim Rocha, que nos respondeu diversos questionamentos sobre a Praça Gomes Freire.

Entrevista com Efraim Rocha

Um primeiro ponto levantado foi da onde surgiu a ideia das obras no Jardim. Efraim respondeu:

“A reforma surgiu de uma necessidade. O jardim apresenta uma deficiência em sua parte de paisagismo e também um problema sério de uma rede de esgoto que passa pelo seu interior e volta para a rua e precisa ser reformado. (outro ponto é) Especialmente a questão luminotécnica. O Jardim precisa de um projeto eficiente de iluminação. Então tudo isso levou a uma ideia de um trabalho maior para poder revitalizar o Jardim como um todo e não apenas cuidar de um ponto específico”.

Recebimento e alocação de verbas

Outro ponto levantado pela reportagem foi talvez o que causou mais polêmica e dúvidas entre a população: de onde vieram as verbas para a reforma e por que da escolha do Jardim para este investimento. Muitos marianenses questionaram o fato de um valor milionário, R$ 3 milhões, ser investido numa obra já pronta, enquanto a cidade sofre em áreas básicas, como saúde, educação, saneamento básico e abastecimento de água.

Efraim tratou então de explicar que as verbas recebidas vem através da Fundação Renova e têm um destino já especificado. O dinheiro recebido é para investimento em praças, especificamente. Ou seja, não há possibilidade desse valor ser revertido para outras áreas. Caso não se invista naquilo para que foi destinada, a verba se perde. Rocha esclareceu:

“Sim, o recurso vem através da Renova, mas eu não sei se é correto falar isso, porque é uma obra do município. A Prefeitura tem autonomia para investir com o dinheiro vindo através da Renova dentro das rubricas que estão dentro do TTAC, que foram passadas pelo Ministério Público. Então tem uma rubrica lá ‘Revitalização de Praça’, tem uma verba que será gerenciada pela Prefeitura dentro daquilo que é estabelecido pelo TTAC. Não só existem medidas compensatórias, mas como medidas indenizatórias também. Então é um recurso destinado ao município, que vem através da Fundação Renova, mas é obra do município. Se o município não quisesse que fizesse, não faria”.

Como forma de esclarecimento, Termo de Transação e Ajustamento de Conduta (TTAC) é um documento que define as formas de reparação das empresas responsáveis pelo rompimento da barragem, em Mariana, no ano de 2015. Para saber mais sobre o TTAC basta clicar aqui ou pesquisar o termo na internet. Dada a informação, Efraim continuou:

“Os recursos não podem ser investidos em outras coisas porque é um recurso específico para esse trabalho, é uma verba específica. Se Mariana não aproveitar essa verba para revitalizar o Jardim, ela não tem como usar desse mesmo recurso para fazer uma outra obra como escola ou saneamento. Esse recurso é específico. Foi uma visão muito clara do prefeito no momento em que se lançou que teria uma verba para essa modalidade de trabalho. E ele abraçou e conseguiu para Mariana esse recurso que, se não for utilizado no Jardim, não será utilizado em outra frente”.

Visto que no ano de 2019, a Prefeitura de Mariana realizou diversas obras, como a inauguração do Estádio do bairro Cabanas, inauguração de Pista de Skate, e eventos gratuitos, como o Viva Mariana Rodeio Show, mas que, ainda assim, a cidade sofre com vários problemas básicos, questionamos ao secretário de cultura como são definidas as prioridades nos investimentos no município. Efraim então respondeu:

“Normalmente tudo é discutido com a comunidade. Por exemplo, no bairro Cabanas já é uma obra que foi iniciada a muitos anos atrás e não foi concluído. O terreno estava lá, todo sendo usado para depósito de lixo, e entulho pelas pessoas. E não há dúvida quanto o bem que esse investimento tem feito. Basta ir lá e ver o número de crianças que participam desses eventos esportivos, o número de pessoas que usam a pista para caminhada. Então essa questão, essa definição, eu acho que tem um poder daquele que foi eleito, que o povo escolheu como prefeito e eu acho que é dentro desse poder sancionatório também em discussão com a comunidade, são definidas essas questões de onde investir. A pista de skate da mesma forma que existe o campo de futebol, que existe o jardim. O skatista também pleiteava esse espaço. E que cada um desses espaços possa se tornar um espaço para a prática do bem, de socialização. É isso que a gente precisa enxergar”.

Acessibilidade

A equipe do Mais Minas também falou sobre a escolha de um projeto de acessibilidade no Jardim, sendo que no restante de Mariana quase não existe acessibilidade, inclusive pelo caráter de formação do espaço físico da cidade. Inclusive os próprios acessos as ruas que têm como destino o jardim são precários. Efraim Rocha afirmou, então, que este é apenas um primeiro passo no município:

“A questão de acessibilidade hoje é muito importante em citar todas as partes e isso tem mudado um pouco. Se já conseguirmos melhorar a acessibilidade ao Jardim, já é um ponto de partida. Existe um projeto de acessibilidade para toda a cidade, mas nós temos que compreender que não é só pelo fato de Mariana ser muito antiga que nossas igrejas não tenham acessibilidade, até prédios mais modernos mesmo, não tão modernos, mas como nosso fórum, não tem. Nossas escolas, muitas delas não tem. A câmara municipal não tem. Então ainda vai levar um tempo para que a acessibilidade seja mais próxima do ideal. Mas já começamos pelo Jardim e pelo entorno do Jardim. Existe um projeto de melhoria nessa questão de acessibilidade, já será um grande passo”.

A acessibilidade é um dos focos principais da revitalização – Crédito da foto: Reprodução

Impacto do fechamento do Jardim

Outro questionamento vindo da população é sobre o impacto do fechamento do Jardim, tanto para os comerciantes que se sustentam com as vendas no local, quanto com as atividades culturais e turísticas realizadas na praça, que incluem, inclusive, o Carnaval. Sobre o tema, Efraim Rocha afirmou:

“Sim. Nós sabemos dos impactos do fechamento do Jardim no Carnaval. Principalmente para os comerciantes que estão aqui ao entorno, o comércio de bar e restaurante. Mas, nós também trabalhamos juntos a eles para criar alternativas. Nós não podemos apenas dizer “porque vai ter o Carnaval, não podemos fazer a obra”. E também que se faça um estudo do impacto positivo depois que a praça estiver pronta, a valorização de cada ponto comercial deste, como vai ser. Para o Carnaval nós estamos programando fazer na rua Frei Durão, aqui desde a esquina da rua Don Souza, Praça Gomes Freire, considerando a rua até em baixo perto do Itaú, o Carnaval de Mariana. Nossas alternativas não digo que vão superar o que é o movimento, mas vamos também minimizar muito o eventual problema do comércio. Mesmo porque também eu acho que a gente tem que pensar: não vamos revitalizar o Jardim e fazer um Carnaval no local igual era feito antes, se não nós vamos vamos ter Jardim. Vamos nos adequar e ir conversando, buscando outras alternativas para que todo mundo tenha um equilibro e ninguém sofra mais que os outros”.

Aproveitando o gancho, o secretário de cultura falou ainda sobre a situação dos comerciantes:

“Nós temos tido reuniões regulares com o comércio do entorno do Jardim. Até porque, desde julho, nós estamos com essa fase experimental das colocações das mesas nas ruas nos sábado, domingos e feriados. Então, nós temos um diálogo muito próximo e estamos buscando alternativas para esse tempo de fechamento da praça, para que seja minimizada a perda deles. Também entendendo que depois de revitalizar essa praça, se Deus quiser, vai haver um aumento de utilização e de superação de uma eventual perda”.

Construção da UPA São Pedro

Quando anunciada a reforma da Praça Gomes Freira, parte da população criticou o investimento na obra, em detrimento de outros problemas do município, como já dito acima. E uma das principais críticas foi em respeito a construção da Unidade de Pronto Atendimento (UPA) São Pedro, no Bairro São Pedro, que começou a ser construída e que teve as obras interrompidas, se tornando um “elefante branco” que nem chegou a ser concluído. Sobre o tema, Efraim disse que é difícil falar, por se tratar de outra alçada, mas que a prefeitura de Mariana já pensa em uma reutilização do espaço.

“A obra da UPA não tem nada a ver com Renova. Vem de outro recurso que é gigantesco e que o município não teve o suficiente para suprir. Então acredito que a Prefeitura vai dar outro destino aquele espaço”, finalizou Efraim.

O que pensa a população

Como pôde se ver nas redes sociais, a população marianense segue dividida quanto ao tema. Num rápido passeio pelo Jardim de Mariana, nossa reportagem falou com alguns moradores da cidade que divergiram sobre o tema.

Paulo Sérgio, que lia tranquilamente seu jornal num dos bancos da cidade, elogiou a obra:

“Fiquei sabendo é que vão haver melhorias aqui na praça, apesar dela ser bem cuidada já, ótima para descanso, passeio, para vir com meu netinho… Aqui tem muitos eventos, excelente! Se (a mudança) for pra melhor, pronto, só alegria. Isso beneficia muitas coisas, o turismo, lazer, descanso, relaxamento”, disse.

Outra moradora, Valdirene Matos, disse concordar caso a obra seja de um saldo positivo para a cidade. Mas afirmou também que não faz sentido o poder público investir em certas áreas e se esquecer do básico, como é o caso da saúde e educação.

“Na verdade não sei muito sobre essa reforma, mas já ouvi falar. Umas pessoas acham bacana, outras não. Por um lado é bom que está renovando, por outro lado não. O Jardim é uma referência aqui da cidade de Mariana, uma cidade histórica aqui de Minas, que recebe muito turista, e mesmo nós aqui da região, gostamos de vir aqui no Jardim. De certa forma, vai tirar a característica do Jardim que é essa do dia de hoje né. Mas se é uma coisa pra melhorar, que seja feita. Mas eu acho que tem outras coisas muito mais necessitadas dentro de Mariana, por exemplo a educação, a saúde, que poderia investir bem mais nelas. Aqui tem outras praças também que podem ser reformadas pras pessoas. Eu acho que se mantivesse ele (o Jardim) como está, poderiam fazer poucas coisas, não precisaria desse dinheiro todo. A população é que sofre com isso (sobre a suposta falta de investimento em outros setores). A classe alta não precisa desses recursos da Prefeitura nem do Governo. As (populações) carentes são as que mais sofrem, e a gente sofre junto, vendo um dinheiro todo desse indo embora em uma coisa que já está pronta”, afirmou.

Opinião dos comerciantes

Outra classe que será muito afetada contra as obras é a dos comerciantes que ficam no entorno do Jardim. A expectativa é que a praça fique fechada por seis meses, o que trará uma grande diminuição do fluxo de pessoas e turistas no local. Entrevistamos duas comerciantes do local que apesar de se mostrarem igualmente apreensivas, têm visões diferentes sobre a revitalização.

Girlei Rita, do Atelier Meninas Arteiras, demonstrou muita preocupação com o período de seis meses em que o Jardim permanecerá fechado. Segundo ela, as conversas com os órgãos públicos tem sido insuficientes.

“Por enquanto a gente não teve assim muita conversa não. O fechamento do Jardim vai ser muito difícil pra gente porque vai impactar muito no comércio. Estamos sem saber o que fazer ainda. A gente depende do Jardim porque as pessoas vêm e ficam na praça, e aí vêm no comércio da gente, compram as coisas. O fechamento do Jardim vai ser terrível pra gente. A gente tem essa esperança sim (que realmente vão aumentar as vendas após a reforma) e que vai ficar legal, vai trazer mais pessoas pro Jardim. Mas o difícil vão ser esses seis meses de fechamento, que pra gente é muito complicado, nós pagamos aluguel, a maioria tem funcionários, vai ser muito difícil de segurar isso. Se não tiver uma ajuda muito grande do governo da cidade, vamos ficar bastante prejudicados. Temos que contar com a ajuda deles, que vai ser difícil. Porque pra fazer evento na rua também é (difícil). A rua é pequena, não tem como, não cabe. Aí vem os eventos que ganhamos dinheiro, o evento melhor que a gente tem aqui, o Carnaval. E aí, o que vai ter de Carnaval aqui? Não vai ter nada. Estamos dependendo deles (da Prefeitura), pra saber o que vai poder ser feito pela gente”, desabafou a comerciante.

Já Rosângela do Espírito Santo, dona de um famoso bar da localidade, afirma saber que os próximos meses serão de dificuldade, mas que no fim valerá a pena. Além disso ela diz que as conversas com as autoridades municipais têm sido satisfatórias.

“A gente tá fazendo reuniões na prefeitura com o Efraim e ele ta dando apoio pra gente sim. Falou que vai ajudar. Porque a gente sabe que o jardim tem que ser reformado né. (a prefeitura) Ainda abriu mão porque ia fechar agora no Natal, mas deixou para fechar dia 2 de janeiro, porque a gente tem muita coisa pra pagar no final de ano. Mas uma hora vai acontecer né, a gente sabe disso, é uma coisa necessária pra cidade. O Jardim ta muito jogado mesmo, tem as manilhas que mexer, a parte de água e esgoto, que volta o cheiro pra cidade, tanto aqui como na parte de cima. Vai dar um impacto, claro que vai dar, fazer o quê. Depois que tiver tudo pronto a gente vai ter o retorno. Vão ser oito meses de dificuldade mesmo. Mas a gente não vai deixar de vender. Vai cair mais a venda, mas a gente tem que estruturar para poder adequar ao sistema da reforma. Mas Deus ajuda que vai dar certo, conto com isso. E outra coisa, ele (Efraim) falou que vai fazer uns eventos, não vai deixar a gente assim na mão. Vamos continuar com nossas mesinhas (no Jardim). O que atrapalha é que o pessoal gosta e vem mais por causa do Jardim mesmo. A gente ta aí, Efraim ta fazendo reunião com a gente direto. Ele tá disposto a ouvir a gente no que for necessário”, afirmou Rosângela.

As obras no Jardim de Mariana estão programadas para começarem em janeiro de 2020. O local será fechado no dia 2 de janeiro e os trabalhos começarão no dia 16 do mesmo mês. A previsão é que a revitalização seja concluída num prazo de seis meses.

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