“Um estudante ‘fora da curva'”. Esta foi a definição encontrada pelo professor Elias Rezende Freitas ao descrever a trajetória do estudante Filipe Vieira Brison, do IFMG – Campus Itabirito. Com apenas 31 anos e surdo, Filipe em breve receberá o título de bacharel em Engenharia Elétrica.
Intitulado “Protótipo Huet: automação residencial utilizando Libras”, o Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) foi apresentado neste semestre. Visando conectar objetos do cotidiano (eletrodomésticos, por exemplo) à internet, o protótipo Huet se diferencia por ser capaz de reconhecer alguns sinais de Libras (Língua Brasileira de Sinais) para acionar equipamentos.
De acordo com Filipe, o protótipo Huet foi batizado em homenagem a Ernest Huet, professor surdo francês responsável pela criação da primeira escola para surdos no Brasil: o Instituto Nacional de Educação de Surdos (INES). Ainda em fase inicial de desenvolvimento, o protótipo é composto de um nó central (um microcomputador de baixo custo) que realiza o processamento das imagens capturadas de forma descentralizada por várias plataformas microcontroladas e que podem ser espalhadas pela casa. “Ao identificar um determinado sinal de Libras pré-programado, o nó central envia uma mensagem via WiFi para outro microcontrolador que aciona/desaciona um relé, permitindo ligar ou desligar uma lâmpada ou um ventilador, por exemplo”, explica o estudante.
Orientador do TCC de Filipe e, também, do trabalho por ele desenvolvido durante um intercâmbio, o professor Elias Freitas o vê como exemplo de esforço, dedicação e sucesso. “Aprendi muito como professor, pois para mim foi muito novo dar aula e orientar uma pessoa surda, conhecer essa realidade e poder contribuir com a comunidade”, afirma o docente, que revelou a possibilidade de apresentar o protótipo do TCC em um congresso nacional.
Segundo o professor, os encontros de orientação eram acompanhados por intérpretes, além de outros recursos como a utilização de legenda automática e do Google Docs. “O final dessa jornada foi muito emocionante. Ver o Filipe apresentando o TCC com muita propriedade e desenvoltura, respondendo aos questionamentos da banca e, principalmente, buscando entender o que a banca estava propondo de melhorias foi algo marcante. Com certeza, o protótipo desenvolvido por ele será um passo na acessibilidade tecnológica para sua comunidade”, destaca Elias.
Ao ser perguntado sobre planos futuros, Filipe pensa em iniciar um mestrado e investir na carreira de engenheiro eletricista. Após passar um período como servidor público da Câmara de Itabirito, Brison hoje atua em Belo Horizonte, na área de elétrica e automação, desenvolvendo projetos de aterramento e de proteção contra descargas atmosféricas. (SPDA).
Temporada em Portugal
Em 2019, Filipe Brison foi o primeiro estudante surdo da Rede Federal a participar de intercâmbio acadêmico, uma iniciativa do Programa Internacionaliza, do IFMG. Durante cinco meses, o estudante esteve no Instituto Politécnico do Porto (IPP) trocando experiências e colaborando na pesquisa “Desenvolvimento de dispositivo para auxílio de pessoas surdas ou com deficiência auditiva capaz de captar e indicar o choro de bebês”. Durante o intercâmbio, Filipe foi acompanhado pelo tradutor de Libras, Paulo Mendanha, do Campus Itabirito, que esteve presente durante a maior parte de sua trajetória acadêmica. “Filipe ingressou em 2016 na graduação e foi aprovado nas vagas de ampla concorrência, sendo o primeiro aluno surdo do ensino superior no Campus Itabirito. Com a entrada dele, professores e estudantes foram se adaptando e entendendo as necessidades de uma pessoa surda”, relata o intérprete.