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Mãe de bebê com doença rara clama por ajuda em Ouro Preto: “Isso não é humano”

Nathan, prestes a completar 2 anos, é o segundo caso de púrpura fulminante no Brasil
28/03/2022 às 15:41
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9 min
Foto: Reprodução/CMOP
Foto: Reprodução/CMOP

“Venho aqui por uma causa de humanidade, porque o que está acontecendo comigo não é humano”. Assim, Kelly Aparecida Xavier, mãe de Nathan, que está prestes a completar 2 anos de idade e sofre com uma doença rara, a púrpura fulminante, iniciou sua fala na Câmara de Ouro Preto na quinta-feira, 24 de março.

Nathan é apenas o segundo caso da doença no Brasil. Ele é cardíaco, hipertenso e perdeu uma visão. Foi preciso retirar um testículo do bebê, que também teve trombose nos dois pés, no lado direito do coração e na cabeça, como consequência da doença.

Desesperada, Kelly foi até a Câmara de Ouro Preto, pois não sabe mais a quem recorrer. Ela pediu para que os vereadores somassem junto com ela na tentativa de triar um caminho para arcar com a regularização da medicação de seu filho, Ceprotin (proteína C humana), que custa R$ 250 mil por mês e é importado, pois ainda não é encontrado no Brasil.

“Eu não tenho mais lazer, não tenho mais vida, pois o meu lazer é ir na UPA de Ouro Preto todos os dias com o meu filho, pois tenho que levá-lo para tomar medicação e de 15 em 15 dias na hematologia do Hospital das Clínicas em Belo Horizonte. A médica do Nathan já me ressaltou a não-regularização da medicação ocasionar em óbito do meu filho. Para mim, era um sonho ser mãe, mas está sendo pesadelo”, contou Kelly.

A mãe de Nathan disse que possui uma liminar na Justiça a favor do seu filho, porém ela não está sendo cumprida pela Secretaria de Estado de Saúde. O coração do pequeno bate apenas 46% e o bebê também está com dilatação nos rins devido ao recebimento de sangue que está sendo feito, porque a regularização do remédio ainda não foi feita. Segundo Kelly, nunca foi dada a quantidade de ampolas que Nathan precisa. O máximo de ampolas que chegaram para atender o bebê foram 100, mas ele precisa de 120.

Nathan é acompanhado por 12 tipos de especialistas em Belo Horizonte, porque é um caso muito grave. Quando Kelly leva seu filho à UPA de Ouro Preto, ela consegue apenas os primeiros socorros, pois não há hematologista na cidade, e é encaminhada para Belo Horizonte, onde está a referência de tratamento de seu filho.

“Minha primeira internação com o Nathan, foram nove meses dormindo na cadeira dentro do hospital, sem sair para nada. A minha luta começou ali pela medicação do Nathan. A minha segunda internação com ele foram três meses e meio novamente por falta de medicação. Minha terceira, dois meses. Na quarta, 28 dias. Quinta, 16 dias. E agora, na sexta, 18 dias, por falta da medicação”, prosseguiu Kelly, em seu relato.

Nathan não tem vacina em dia, porque, para ele vacinar, precisa ficar três meses sem receber uma gota de sangue. Para que isso aconteça, a medicação tem que ser regularizada. Kelly leva seu filho para a UPA de Ouro Preto todos os dias para receber a medicação. Ele fica sozinho em uma sala, porque não pode ter contato com outras crianças. O transporte dele é individualizado pela Prefeitura Municipal.

“Os médicos me falam que, se Nathan pegar um sarampo, uma rubéola ou uma caxumba, é fatal, porque não tem nenhuma vacina que o proteja. Todo mês esse relatório é enviado para a Defensoria Pública da União informando o estado de saúde do Nathan”, contou Kelly.

Veja o vídeo de parte do relato de Kelly (IMAGENS FORTES):

A mãe de Nathan relatou que enfrentou dificuldades desde sua gravidez. Ela teve pré-eclâmpsia enquanto estava grávida e possui atrofia congênita, igual a seu filho. O marido de Kelly também sofre com problemas de audição aos 52 anos. Ele perdeu 50% da audição de um lado e 60% do outro. Ambos estão desempregados, vivendo com a ajuda da população de Ouro Preto.

“Eu agradeço muito a Deus pela oportunidade de me dar saúde para lutar pelo meu filho e agradeço a ele, também, pelas pessoas que ele está enviando para o meu caminho, porque, não é vergonha, estamos vivendo de doação. Alguém daria emprego para uma pessoa que não escuta? A situação do meu marido é essa. Estou na terceira tentativa do BBPC para o meu filho e foi negado. Já fui atrás de tudo quanto é advogado”, continuou Kelly.

A mãe de Nathan também disse que a prefeitura tem sido muito “parceira”, assim como a população de Ouro Preto, os enfermeiros da UPA da cidade e do Hospital das Clínicas.

“Quando cheguei com Nathan no Hospital das Clínicas, com dois dias de vida, a médica falou ‘vamos ver o que podemos fazer para salvar o seu filho, porque não temos diagnóstico da doença ainda’. Eu, no começo, fiquei muito baqueada, muito para baixo e agradeço às amizades que fiz no hospital, pessoas que foram parceiras e me ajudaram para eu me levantar e não ficar tão para baixo”, contou.

Dificuldades

Kelly leva Nathan na UPA todos os dias e o pequeno fica em torno de uma hora e meia em uma bomba de seringa. A mãe contou que enfrenta dificuldades também para acompanhar seu filho em certos momentos. Dentro do hospital, ela dorme na cadeira e disse que não recebe uma comida de qualidade.

No dia 21 de março, Kelly ajuizou a Prefeitura de Ouro Preto, porque forneceram um carro lotado para Belo Horizonte. Segundo a mãe, o veículo tinha capacidade para seis pessoas e havia oito dentro do carro. Entre elas, uma com uma crise de convulsão e outro gripado, enquanto Nathan possui imunização baixa.

“Eu marquei o transporte no dia 13 do mês de março para eles se organizarem e não dar esse tipo de atrito. Eu vou para Belo Horizonte novamente no dia 25 do mês que vem, o transporte já está marcado para eles se organizarem e não ter transporte coletivo, porque o meu filho não pode. Não é luxo, é a luta pela vida do meu filho”, continuou.

Nathan também tem uma lesão na barriga e não pode usar um modelo comum de fralda, pois o plástico provoca sangramento no pequeno que vai completar 2 anos no dia 26 de abril. De acordo com Kelly, o segundo caso da doença no país é de um menino com 13 anos e que está em um quadro ainda mais grave que seu filho, tendo um custo de R$ 600 mil mensais com medicação.

Kelly contou também que Nathan foi intubado em fevereiro, com sedação, pois sua pressão estava em 16 e não suportava respirar. O pequeno inteirou 30 acessos centrais, além de uma defecação. Mesmo tomando o plasma e furozemida (diurético para eliminar líquido do corpo), ele ainda não estava suportando manter a respiração.

Por fim, Kelly fez um apelo aos vereadores para ajudarem a salvar a vida de seu filho e poder viver com dignidade. Por meio das redes sociais, ela faz campanha para arrecadar doações, que podem ser feitas pelo Pix 31995966299.

As propostas dos vereadores foram:

  • Agendar a ida de todos os membros do poder Legislativo Municipal que se sentirem confortáveis na Secretaria Estadual de Saúde para levar o caso;
  • Fazer uma Representação no Ministério Público sobre o caso do Nathan;
  • Avaliar alguma forma da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social amparar Kelly;
  • Acionar o procurador para saber o que fazer com os órgãos que não estão cumprindo com a decisão liminar;
  • Procurar o secretário municipal de Desenvolvimento Social, Edvaldo Rocha, para ter acesso à fralda especial.

Por fim, Kelly informou que conseguiu um aparelho auditivo para seu marido em Ponte Nova e aguarda uma logística da Secretaria de Saúde de Ouro Preto para buscá-lo.

O Mais Minas entrou em contato com o secretário de Saúde de Ouro Preto, Leandro Moreira, e aguarda uma resposta.

Secretaria de Saúde de Minas Gerais

Ao Radar Geral, a Secretaria do Estado de Saúde informou que a aquisição do fármaco é realizada por meio de importação, em que os requisitos para compra são específicos para que haja a compra conforme a legislação, o que envolve maior número de documentos ou procedimentos, nos termos das compras públicas. Segundo a SES-MG, o último procedimento licitatório, nenhum fornecedor enviou proposta para realizar a venda ao Estado, mas que iniciou trâmites internos para repetir a licitação.

Apesar disso, a Secretaria de Saúde de Minas Gerais disse que o paciente tem sido atendido desde o deferimento da liminar, em setembro de 2020, por meio de depósitos ou bloqueios judiciais. No dia 8 de março, o poder Judiciário realizou bloqueio no valor de R$ 563.869,87, suficiente para aquisição do medicamento, despesas e pagamento dos tributos. Portanto, os valores estão à disposição para que os responsáveis pelo paciente possam fazer a aquisição de forma direta, segundo o SES-MG.

Por fim, a pasta da Saúde alegou que vem prestando todo auxílio relevante para o desembaraço relacionado à compra internacional e demais questões burocráticas, visando o atendimento ao paciente.

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