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Opinião: Quanto a atual política atrapalha o povo de Ouro Preto?

21/02/2022 às 13:50
Tempo de leitura
9 min
Foto: Facebook/FAOP
Foto: Facebook/FAOP

Ouro Preto é uma cidade “de milhões”, utilizando da nova gíria viral dos jovens nas redes sociais. Para ser mais preciso, de R$ 428.487.858,65 em receita, de acordo com os dados do Portal Transparência da prefeitura. Porém, é só dar uma olhada nas redes sociais para ver uma ausência constante desse dinheiro em diversos lugares do município. São bairros muito mal estruturados, pessoas sem casa e sem resposta para um prazo definido para terem um auxílio. São alunos que moram nos distritos não tendo o mesmo acesso às escolas como os estudantes da sede. São várias pessoas indignadas, não se sentido assistidas pelo poder público.

Na verdade, muitos dos problemas, principalmente relacionados à desigualdade social, estão escancarados na cidade. Basta olhar a riqueza do centro histórico em detrimento da pobreza nos bairros periféricos. Outra questão que tem sido muito falada neste início de ano é o estrago causado pelas chuvas, algo que não é possível a gestão pública evitar. Porém, moradores do bairro mais atingido, o Taquaral, por exemplo, denunciam que os problemas de estrutura no local perduram há anos e nunca têm uma ação efetiva por parte da prefeitura para resolver a situação de vez.

Fora isso, a habitação em Ouro Preto é algo completamente injusto. Enquanto há mais de 200 pessoas sonhando com uma casa própria, mesmo não tendo dinheiro para tal, 1.191.595,72 m² de terra foram cedidas gratuitamente em 1953 para a Eletro Química Brasileira S/A, que posteriormente foram ocupadas pela ALCAN Alumínio do Brasil S.A, que, por sua vez, foi sucedida pela Novelis do Brasil.

E o que falar do saneamento básico de Ouro Preto? Uma cidade tricentenária, berço de Minas Gerais, conhecida no mundo todo, não é capaz de fornecer uma água e tratamento de esgoto para a sua população com sucesso. Como nos tempos de Vila Rica, há 300 anos o esgoto da cidade é lançado diretamente nos córregos. Então, aparece o chamado “Novo Marco Regulatório do Saneamento” (Lei Federal 14.026, de 15 de julho de 2020), que altera as regras para a prestação de serviços no setor, promovendo a ampliação da participação de empresas do setor privado neste mercado, com o objetivo último de universalizar o acesso ao saneamento para todos e, assim, nasce o pesadelo dos ouro-pretanos e o assunto mais falado no município no último ano, as tarifas da Saneouro.

Dentre tantos problemas, qual o ponto comum? A administração pública. Por ela, passam-se líderes que ocupam o poder Executivo e Legislativo. Assim, inicia-se uma engrenagem falha em diversos aspectos para tentar gerir uma cidade. Quando acontece as eleições, os candidatos se mostram os melhores amigos das pessoas que não têm dinheiro para pagar a tarifa de água, que moram em uma casa em área de risco extremo e que estão desempregadas. Na hora de pedir o voto, eles até entram nas moradias dessas pessoas, tomam um café com elas e lhes dão um abraço. O que vem depois disso já se sabe. Na realidade, o ponto aqui é para além de se discutir esse vício da política que usa da legalidade da democracia para ser picareta. É sobre o que vem depois, falar do quanto a execução do exercício político atrapalha a gestão das pessoas necessitadas.

Muitos ouro-pretanos são “chatos”, porque querem aquilo que lhes é por direito. O maior exemplo de qualidade seletiva de vida em uma sociedade é em Ouro Preto, uma cidade repleta de riquezas e que abriga um povo muito necessitado. E aí então vem as ações da gestão pública para ser uma proposta de intervenção aos problemas urgentes dos ouro-pretanos. O que escutamos quanto a isso? Em diversas entrevistas, incluindo rede Globo, mídia local e o Mais Minas é: “a gestão anterior não fez”, “o prefeito anterior deixou dinheiro guardado”, “eu fiz no ano x e ele não deu continuidade”.

Se em uma prova dissertativa, como acontece no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), o candidato, no último parágrafo, como proposta de intervenção, coloca que “o responsável anterior não fez e por isso a situação é essa”, não há muitas chances dele conseguir uma boa nota. O lugar dessa colocação é na explanação do problema, mas não são propostas de verdade. Onde está a ação? Nem é preciso falar sobre promessas, porque aí já é entrar no mérito de quando determinada promessa é mentirosa e quando é apenas incapacidade de fazer.

É sério que depois de um ano de hidrometração da Saneouro, a principal defesa do prefeito é que o gestor anterior cedeu de graça o serviço de saneamento e abastecimento de água para uma empresa privada? Mas onde estão as ações do atual gestor? Estudos, especulações, promessas, qualquer coisa usada no gerúndio não é o bastante para atender o que a população precisa. Já passou da hora do “estamos fazendo” se tornar “feito”.

O que parece é que o prefeito está completamente “enrolado” com a situação do saneamento em Ouro Preto. Ele prometeu tirar a empresa da cidade na sua campanha, algo que não conseguiu em 14 meses de governo e que, até o momento, só será possível desembolsando de R$ 80 milhões a R$ 100 milhões em uma encampação. Mas pensar num investimento para subsidiar a tarifa parcialmente para que a conta saia mais barata não é possível só porque foi uma ação do governo anterior? De acordo com o procurador geral do Município, Diogo Ribeiro, essa é uma medida que está sendo estudada, ainda que distante de uma conclusão, porém em caráter de curto prazo, de forma paliativa e não definitiva.

Enquanto isso, o povo inflama o grito de “Fora Saneouro!”, incentivado pelos vereadores, que também não querem ficar com a imagem de alguém que defende a permanência da empresa na cidade, e a prefeitura trabalha tentando retirar a empresa de todas as formas, abdicando de qualquer avanço nessa questão. Afinal, vários vereadores já concordaram que não são contra que se pague água desde que seja uma tarifa justa. Por que não se tenta negociar uma tarifa justa, então? Não excluindo a possibilidade de retirar a empresa, mas é preciso repertório para solucionar esse problema de forma mais rápida.

Quando se conversa com o opositor ao governo, então, se vê algo pior ainda. É um eterno fiscal de erros para o seu benefício próprio. O político de oposição aponta situações de sofrimento de várias pessoas para ganhar visibilidade ou mesmo dar uma imagem negativa para a atual administração municipal. Essa ação oportunista é frequentemente vista em vereadores, ex-prefeitos e pré-candidatos. É quase certo que quando um ex-prefeito fará uma declaração, ele citará alguma descontinuidade do atual governo de algo que ele construiu. E assim, forma-se um circo, financiado pelo povo de forma obrigatória, de quem está fora do poder fala mal de quem ocupa o poder e vice-versa.

Justamente nessa questão que a política é falha. As ações dos representantes é de apontar o erro do outro e muito pouco fica para a ação de verdade. Assim, comunidades periféricas (onde inclusive já morei) se organizam de forma independente. Mesmo que, em algumas situações, de forma precária financeiramente, a administração local é feita pelos próprios moradores, sem a expectativa de serem atendidas pela prefeitura. A administração pública, por vezes, atrapalha essa organização inclusive, já que cobra impostos desse núcleo que não se sente assistido pelo Município.

Porém, esse modelo de política não é falho apenas em Ouro Preto, é no Brasil inteiro. Um exemplo disso foi a entrega da restauração da histórica Igreja Matriz de Santo Antônio, em Glaura, distrito ouro-pretano, que contou com um discurso cômico do Ministro do Turismo, Gilson Machado Neto, dizendo que são três anos de governo Bolsonaro sem mandar dinheiro para Cuba e Venezuela e sem ministro, secretário ou presidente de banco preso, alfinetando o governo do Partido dos Trabalhadores que ficou 14 anos no poder e já se encontra bem nas pesquisas para a eleição presidencial deste ano. O próprio presidente Jair Bolsonaro chegou a extinguir o Bolsa Família, de autoria do PT, para criar o Auxílio Brasil apenas para falar que é um programa do seu governo.

Próximo das conclusões finais, este texto não vai se eximir de uma proposta de intervenção. É possível fazer uma política mais sadia, menos tendenciosa e olhando para o próprio umbigo. Há como ter bom senso o suficiente para reduzir o egoísmo, colocar a população realmente como prioridade e não usá-la para atacar um adversário ou se autopromover. Não é justo. Existem pessoas que estão batalhando muito para garantir um lar para morar, uma comida e um futuro para os filhos, é mau-caratismo utilizar disso para fazer um circo. Os políticos precisam ter um respeito maior pela população, afinal, é uma sociedade que está sendo gerida. O bem-estar das pessoas precisa disso. Portanto, os gestores e os fiscais precisam ser mais sensíveis e menos gananciosos, o que está em jogo é um futuro de uma criança, uma qualidade de vida para uma família e um bem-estar social. Assumir a responsabilidade de estar em um cargo na gestão pública é assumir um compromisso importante com vidas de seres humanos, para além de qualquer anseio próprio ou de algum coletivo específico. É preciso quebrar promessas e parar com tantas acusações. No fim das contas, o que todos querem é proposição e ação.

Última atualização em 19/08/2022 às 05:11