Opinião: O Mineirão é, primeiramente, do futebol mineiro

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Após escrever sobre os problemas financeiros e judiciais do Cruzeiro em duas partes: uma que tem como foco a gestão atual e outra que visa a anterior, uso do espaço para escrever um artigo de opinião. Nele irei deixar um pouco de lado o “fazer notícia” em si e buscar analisar a queda de braço pelo Mineirão, da maneira esportiva e histórica.
A manhã desta terça-feira (11) deu ao torcedor cruzeirense, já combalido pela queda de rendimento dentro de campo e pela incerteza fora dele, mais um motivo para se preocupar. O jornalista especializado em negócios do esporte, Rodrigo Capelo, publicou em seu blog uma notícia onde conta que a Minas Arena, responsável por administrar o Mineirão, deu como rescindido seu contrato de fidelidade com o Cruzeiro.

Opinião: O Mineirão é, primeiramente, do futebol mineiro

Mineirão na final da Copa do Brasil de 2017, vencida pelo Cruzeiro – Crédito da foto: Ramon Lisboa/EM/D.A Pres

O caso

A situação se dá por uma dívida de R$ 26 milhões entre Cruzeiro e Minas Arena. A maior parte, R$ 24 milhões, vem da diretoria anterior, que teve Gilvan de Pinho Tavares como presidente. Para resumir a história, o time celeste entendeu que não precisaria mais pagar os valores previstos em seu contrato de fidelidade com a Minas Arena, quando o Atlético-MG, maior rival do clube e que não atua regularmente no estádio, conseguiu fechar um acordo onde deixaria de pagar inúmeros valores diversos a empresa, em 2013, na final da Copa Libertadores. O acordo foi totalmente benéfico ao time alvinegro, que teve uma renda exorbitante na partida.
A diretoria do Cruzeiro viu, na ocasião, favorecimento ao alvinegro e decidiu que se o Atlético não precisaria pagar certas despesas, o time celeste também não precisaria. O clube alegou que existia uma cláusula no contrato de fidelidade que lhe permite a mesma condição que qualquer clube que jogasse lá. A alegação da Minas Arena é que a condição foi dada ao Governo do Estado, não a um clube por isso não se aplica a cláusula. E a partir disso nasceu e cresceu a dívida.
Então começaram a surgir processos e ações judiciais e se iniciou uma queda de braça que dura até hoje entre clube e Minas Arena. A rescisão unilateral (solicitada por uma das partes) do contrato invalida todos os acordos por manutenção e utilização do espaço do estádio e ainda pode resultar numa multa de R$ 14 milhões da parte inadimplente do acordo.
É bom deixar claro que, como informado pelo jornalista Douglas Ribeiro, o Cruzeiro não rompe com o estádio Mineirão (onde continuará a mandar os jogos) e sim com a concessionária que administra o estádio.

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Acordo com a Minas Arena rendeu ao Galo a maior renda da história do futebol brasileiro – Crédito da foto: Alexandre Rezende

O Mineirão é do futebol

Esquecendo um pouco a situação jurídica, já brevemente explicada acima, vamos falar de futebol. É, ao meu ver, no mínimo absurdo o poder que empresas e pessoas que não agregam ao esporte tem sobre o esporte, atualmente. É absurdo que em algum momento o Cruzeiro ou qualquer outro time se torne impedido de jogar nos estádios que estes mesmos eternizaram por influência externa ao futebol.
A Minas Arena é uma empresa que administra o Mineirão desde sua reforma, mas sumariamente, jamais acrescentou nada ao estádio. Os problemas que nasceram entre Mineirão e Cruzeiro vem diretamente da atuação da empresa. Era inimaginável que antes da reforma, quando o estádio era administrado pela ADEMG, problemas assim acontecessem simplesmente pela forma como tudo era feito. Tendo, inclusive, desde a inauguração do estádio um uso mútuo de Atlético e Cruzeiro.

Elefante branco

Sem o Cruzeiro, hoje o Mineirão é um elefante branco. Como a Arena Manaus, a Arena Pantanal, que esporadicamente recebem shows e jogos grandes, mas que em boa parte do ano ficam paradas. O Atlético, desde 2010 não joga regularmente no Gigante da Pampulha e logo terá seu estádio próprio, reescrevendo sua identificação com arenas. Provavelmente o alvinegro jamais voltará a atuar regularmente no estádio do povo mineiro.
A questão que levanto aqui, repito, não engloba questões judiciais, que sim, tem de ser quitadas e nem u clube específico, valendo isso pro Atlético ou qualquer outro. Ela trata do poder que meios não futebolísticos tem no futebol. É absurdo também que o Galo saia do Mineirão, estádio onde construiu sua rica história, por não ser vantajoso ao clube. Que este tenha que atuar num estádio com capacidade quase seis vezes menor que seu quadro de sócios torcedores.

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Elefante branco: estádio Mané Garrincha, localizado em Brasília, custou R$ 2 bilhões e dá prejuízo anual de R$ 6,4 milhões – Crédito da foto: Reprodução/Internet

54 anos de cuidado

Enfim, espero que este litígio seja resolvido da melhor maneira e que se enxergue o Mineirão como, primeiramente, um templo do futebol. Que shows que destroem o gramado são enxergados como eventos secundários, que jamais um time tenha que deixar sua casa por situações alheias ao que ocorre dentro as quatro linhas.
Afinal um estádio é mais importante pra seu time que o camisa 10 ou o goleiro. Ganhar do Grêmio no Olímpico ou na Arena, do Athletico na baixada, do Santos na Vila, do Cruzeiro no Mineirão, é difícil até se as camisas estiverem lá, jogando sozinhas.
Espero que as empresas e os cartolas por trás de cada passo dado pelo futebol enxerguem que não existe “Arena” sem jogos e torcida. Que antes de pensarem em tirar o Cruzeiro do Mineirão, ou antes de o time ser lesado por atuar lá, hoje, em Minas Gerais, não existe Mineirão sem Cruzeiro.


Que em 1966, quando o Mineirão tinha um aninho de idade, e quase 50 anos antes da Minas Arena pensar em existir, o Cruzeiro já dava sua primeira volta olímpica no estádio. Que o Cruzeiro tem os recordes de público no novo e velho Mineirão e que já conquistou tantas coisas neste que é difícil contar. Que a segunda maior franquia de games de futebol do mundo, o PES, nomeou o Mineirão como Toca III (fato que inclusive fez a empresa tomar medidas contrárias) pela identificação do estádio com o time celeste.
O Mineirão é do torcedor que vai de regata e boné ao campo. É do jogador que calça chuteiras e do povo que passa por ele ao ir trabalhar, de manhã, e lembra dos momentos que viveu ali. Os colarinhos brancos que fiquem com suas salas refrigeradas.

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Mineirão dividido entre torcidas de Atlético e Cruzeiro, tempos bons que não voltam mais – Crédito da foto: Divulgação/ Mineirão

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